Serviço de Utilidade Pública - Lei Municipal nº 5096/2011 de 24 de Novembro de 2011
Criado por Adriano Araújo e Emmanuel Sousa
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Apesar de o texto acima relatar que o ano da foto do "Ipiranga Esporte Clube" é 1923, professor Mário Vinicius Carneiro, estudioso de nosso futebol, nos lembrou muito bem, que o Ipiranga só foi fundado no ano de 1926 e portanto, tal registro possivelmente seja de 1933.

Na imagem histórica, podemos visualizar a imagem de "Lula Pintor". Professor Mário em sua pesquisa sobre nosso futebol, chegou a entrevistá-lo, material este que foi cedido ao nosso blog. Abaixo, reproduziremos na íntegra, a entrevista:

ENTREVISTA COM  LULA  EX-GOLEIRO DO IPIRANGA FUTEBOL CLUBE ENTRE 1931 A 1938

Na década de 30, quando o  futebol campinense  ainda era  feito  de maneira amadorística, este  cidadão, prestes a completar  93 anos, era  uma verdadeira muralha no gol do Ipiranga Futebol  Clube. Infelizmente,  devido à uma grave doença,  perdeu totalmente a visão, há 12 anos. Entretanto, dotado de uma  memória  excepcional e com grande presença de humor,  lembra com detalhes da época quando  chegou a Campina Grande, os primeiros tempos do Treze e do próprio Ipiranga.  Luís Agostinho,  o LULA, é o último atleta ainda vivo do time do Ipiranga, que conquistaria em 1933, de forma invicta, o Campeonato da Cidade.    

Qual o seu  nome  e onde o  nasceu ?

LULA:  Meu nome é Luís Agostinho, mas sempre fui chamado de Lula. Nasci em 06 de setembro de 1907,  no sítio Laranjeira, próximo do sítio Jorge, perto do distrito  de Santa Terezinha. Depois, minha família foi morar no  Distrito do Marinho.

Quando começou o seu interesse por futebol ?

LULA:  Eu ainda era criança.  Nós jogávamos  com uma bolinha de borracha, como estas que ainda hoje existem. Fui crescendo e gostando do esporte. Quando  tinha 21 anos, entrei para o meu primeiro clube, o “21 Futebol Clube”, de  uma fazenda  na estrada do  Marinho,   chamada  “Monteiro”, de  propriedade do  Sr. João Monteiro, que organizou o time. Isto foi em 1928.

Por que  o  clube tinha  esta  denominação ?

LULA: 
Não sei. Ele apenas dizia que gostava deste número (risos)...

Nesta época, o senhor já jogava  como goleiro ?

LULA: 
Já. Desde criança tinha vontade de jogar no gol. Quando comecei a treinar futebol,  fui para a posição. Deu certo porque eu gostei e eles  (os outros jogadores) também. 

Como era o futebol em Campina Grande ?

LULA: 
O Treze havia sido fundado em 1925. Em maio do ano seguinte,  foi fundado o Ipiranga. Existiam ainda outros, como o Palestra, o Comercial...  Cheguei em Campina Grande em 1928. Tive, então, a oportunidade de acompanhar o Treze e o Ipiranga, praticamente nos  primeiros anos de vida.

Como eram aqueles  dois clubes, naquela época ? 

LULA: 
O Treze era formado por pessoas que trabalhavam no comércio:  empregados ou proprietários de estabelecimento, além de funcionários públicos. Por exemplo, o beque   “seu”  Lima era empregado da empresa de Tito Sodré; o outro, Zé Eloy,  era ourives. Zé Castro negociava com  couro. Zacarias “Cotó”,  que  tinha este apelido por ser baixinho,  trabalhava numa farmácia...  Era considerado o time da elite. Já o Ipiranga era composto por pessoas mais simples, a maioria mecânicos e agricultores,  sendo chamado de “o time dos negros”, isto durante anos, pois era composto praticamente por pessoas desta cor. Quando cheguei ao Ipiranga,  três anos depois,  o mais alvo era eu (risos)... 

E os jogos entre estes dois times ?   

LULA:
Dia de jogo entre  Treze e Ipiranga, o campo ficava lotado. Havia uma rivalidade entre os dois e a torcida trezeana não admitia  que o seu  time perdesse. Então, quando era jogo contra o Ipiranga  o presidente Antonio Miguel, que era rico,  mandava buscar  na sexta-feira,  três jogadores de Natal (RN):   Poty,  Rodolfo e  Glicério, que sempre  ficavam hospedados na casa do diretor alvinegro. Somente uma única vez o Ipiranga, até 1929, conseguiu vencer o Treze. No restante dos jogos, ou empatou ou  foi derrotado.  

O senhor jogou contra o Treze alguma vez ?

LULA: 
Não. O Treze acabou seu time em 1929, somente  voltando em  1937.  Mesmo nesta segunda fase,  não tive oportunidade de enfrentá-lo. 

E  por que o alvinegro acabou ? Teria sido  por causa da Revolução, como dizem algumas pessoas  ?

LULA:
Não ! O Treze acabou o time  ainda em 1929,  por um entendimento entre eles (jogadores e diretores). Neste mesmo ano,  se acabariam também o Palestra e o Comercial.  Já a Revolução ocorreu em (outubro de ) 1930, por motivos políticos e não alterou em nada o futebol de Campina. Os jogos continuaram acontecendo  normalmente. 

O senhor foi goleiro do Ipiranga Futebol Clube durante quase sete anos. Como se deu a sua ida para aquele clube ?

LULA: 
Em 1930, eu me associei ao Ipiranga. Mas eu tinha  ocupações na agricultura e só comecei a jogar em 1931. As cores do uniforme eram encarnado (sic) e branco. Nós jogávamos muito, tanto aqui, contra os clubes locais,  como em João Pessoa.

Então,  vamos por etapas. Quais os clubes que existiam aqui  em  Campina Grande, quando o senhor começou a atuar  no Ipiranga  ?

LULA: 
Cinco: o  Ipiranga, o Paulistano, o CAC (Centro Atlético Campinense), o Sete e um time do Monte Santo (não lembro o nome deste). Os quatro primeiros  disputavam o Campeonato da Cidade. O CAC era  formado pelos jogadores do Treze em 1929.  Já o  Sete era  o time do Curtume dos Motta, também muito bom. Recordo que as partidas eram realizadas em  dois campos: o Comercial e o Palestra. Na Prata, onde hoje é o templo da “Assembléia de Deus”,  ficava o  campo do Palestra, que era  cercado de  folhas  de zinco. Já o do Comercial ficava próximo à  SANBRA,  sendo este murado.  Todos eram  de areia, marcados,  não existindo grama. Não havia, também,  redes  nas traves. Somente depois que eu  deixei de jogar  começaram a colocá-las. Já o juiz não usava roupa especial. Era a paisana  mesmo:  de paletó, gravata e chapéu !   

Os jogos contra  clubes da  capital  eram realizados  também em João Pessoa ?

LULA: 
Sim. Saíamos no sábado pela manhã,  de  Campina Grande até Itabaiana. Depois, pegávamos outra linha para João Pessoa. Chegávamos à tarde, indo para o hotel. O jogo era  no domingo.

Quais os times de João Pessoa que o senhor enfrentou ?  

LULA:
   Palmeiras, Pytaguares, Vasco da Gama,  Cabo Branco, América... Aliás, nos times de João Pessoa  nós  dávamos de “macaca” (risos)... Fomos vitoriosos em todas as partidas,  exceto duas: uma vez contra o América, quando perdemos,  e contra  um time de Bayeux,  com  quem empatamos em 2 x 2.

Qual o time mais forte de todos que o senhor  já enfrentou  ?

LULA: 
O Palmeiras de João Pessoa, quando vencemos por  1 x 0. Outro grande clube foi o América, também da capital. Este jogo nós  perdemos, sendo o gol marcado pelo filho do Ministro José Américo, o José Américo Filho, que praticamente era o dono da equipe. Depois, ele faria parte de um outro time: o Botafogo, que ainda hoje existe.

Sobre esta fotografia  do Ipiranga, ela foi tirada em  que ano ?

LULA: 
Em 1932, no campo do Comercial.  Ao lado dos atletas, estão os diretores do clube. Entre eles está Mestre Inácio,  que era praticamente o dono do time. Ele tinha uma oficina mecânica e, para quem era seu funcionário, ele arranjava uma vaga para jogar no Ipiranga. Quando alguém lhe procurava pedindo emprego no seu estabelecimento, sempre dizia: “Emprego eu não tenho.  Mas existe bastante trabalho e uma vaga prá jogar no Ipiranga...” (Nota: no entendimento do pessoal da época,  “emprego” normalmente significava trabalhar pouco e receber salário...)          

E este  garotinho que está sentado  à sua frente ?  

LULA:
  Ele estava no  campo no dia do jogo. Na hora da foto,  aproximou-se  de mim  e  acabou saindo na fotografia. Não estava nada planejado. Muitos anos depois, tive notícias dele, através de uma pessoa que  me contou que o encontrara  em um barzinho na praia,  em  João Pessoa.   Mas,  eu nunca soube o seu nome. Ainda no retrato, ao meu lado, está  Mira, o meu full-back, que morreu há poucos anos. 

Quando o senhor parou de jogar futebol ?

LULA:
  Em 1938. Eu casara em 1935 e já era pai de três filhos. Então, eu pensei seriamente e resolvi  abandonar a carreira de atleta. O time era pobre, não tinha uma “caixa de remédios” ( uma pequena “farmácia”) para os atletas, como existia no Treze, por exemplo.  Se eu me machucasse sério e perdesse o trabalho, ficaria difícil para minha família.  Então resolvi  abandonar o esporte.   Ainda acompanhei  futebol durante  muitos anos, mas a partir daí  somente como torcedor.  

*Agradecemos mais uma vez ao professor Mário por mais este grande registro histórico.

1 Comment

  1. Anônimo on 23 de março de 2011 às 10:15

    Olá, meu nome é Renato Luis, sou gaúcho torcedor do Inter, estou atrás das cores de alguns times de futebol do brasil, incluindo da Paraíba! Achei excelente esta entrevista resgatando um trecho da mais pura e límpida história do futebol paraíbano, parabéns por essa maravilhosa entrevista!Quissá fossem feitas inúmeras entrevistas como essa e o nosso futebol brasileiro com certeza teria menos lacunas históricas. Por acaso vocês não saberiam me dizer qual as cores dos seguintes clubes de futebol da paraíba:

    vices campeonato paraibano:
    São Paulo (1920);
    Internacional SC (1931);
    Pytaguares (1932);
    Sol Levante (1936);
    Delaport (1944);
    União(1946).

    Desde já agradeço ao sr. Adriano Araújo e ao sr. Emmanuel Sousa e desejo vida longa ao blog de vocês .Parabéns pela iniciativa!!!!

     


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