Serviço de Utilidade Pública - Lei Municipal nº 5096/2011 de 24 de Novembro de 2011
Criado por Adriano Araújo e Emmanuel Sousa
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O seguinte texto foi encontrado na "Revista do Campinense-2ª Edição", publicada em 1975. Trata-se de um texto de Palmeira Guimarães, relatando peculiaridades do futebol de Campina Grande na década de 50.


O FUTEBOL CAMPINENSE NA DÉCADA DE 50

Nunca me agradou muito falar do passado. Preferi sempre alinhar-me entre os que vivem com a possível intensidade cada momento, para esquecê-lo em seguida e passar ao instante seguinte, sem desilusões e sem saudade.  Por isso, talvez, os anos têm passado por mim sem deixar cicatrizes irreparáveis e a sofrência (que não tem sido pouca) não tem conseguido produzir maiores arranhões em minh´alma...

Entretanto, para atender a um amigo (no caso, Antonio Lucena), recorro aos empoeirados compartimentos da memória e tento um reencontro com o ambiente futebolístico de Campina Grande na década de 50, meu tempo de radialista.

Antes de tudo, uma advertência, em tom de apelo, aos implacáveis colecionadores de recortes, farejadores de cochilos históricos, gravadores de fisionomias, nomes e datas: não consultei nenhum arquivo e não me preocupou ordem cronológica de qualquer fato ou circunstância aqui referidos. Que sejam generosos com o escriba, que não tem a pretensão de fazer história, mas tão somente de procurar reproduzir lembranças de há muito tido como imprestáveis e sepultas.

Primeira constatação do meu esforço de memória: as pessoas, mais do que os fatos, ganham consistência em minha mente. E, entre elas, Otacílio Timóteo, Severino Marinho Leite, Fernando Arruda, Gilberto Dias, Raul Pequeno, Afonso Agra, Raimundo Luz, João Nogueira Neto, João Lira Braga, Hermínio Soares. Esses dentre outros menos ostensivos, formavam a elite que se revezava na direção e na defesa dos interesses do Treze Futebol Clube, única agremiação da cidade, naquela época, com coragem suficiente (e que coragem) para arrostar com o sacrifício de manter um time com bases profissionais.

Dos jogadores daquele tempo, alguns desfilam, ainda agora, diante de mim, com impressionante nitidez. Os goleiros sempre me causaram a mais viva admiração, por seu sangue frio e sua elasticidade. E o Treze - como o Fluminense do Rio - sempre foi o time dos grandes goleiros. Jael, Álvaro que mais parecia uma gaivota; Jumento, com suas pernas tortas a "La Garrincha" e seu incomparável arrojo dentro da pequena área; Orlando Vilarim (O Porco Russo), o "cego" de maior visão que conheci; Amaury (Capiba) elegante no gol como um manequim de Pierre Cardin, mas inexcedível em elasticidade e segurança; o monstro sagrado Harry Carey que durante muitos anos carregou o Treze nas costas; e finalmente, Djalma - o melhor de todos - que como um meteoro, levitou em Campina Grande e no gol do Treze durante alguns meses e entrou em órbita.

Parece que os vejo, camisa azul (ou cinza) com o número 1 às costas, fechando o gol, garantindo vitórias, elaborando a matéria-prima dos memoráveis papos da esquina da Flórida e eletrizando a torcida, já naquele tempo personificada na energia e na paixão de Pinta Cega, a maior vocação de líder de torcida que conheci.

Dos jogadores de linha - como se dizia na época - recordo-me do Raimundo, Baleia, Félix, Urai, Louro, Totota, Martelo, Arrupiado, João Luiz, todos grandes baluartes do sistema defensivo de meio de campo, e, entre os atacantes, Marinho, Biu Puta Preta, Manuel Pé-de-Ferro, Mário, Rozendo, Araújo, Josias, Ruivo, Hercílio, Pitota, alguns deles craque consumados.

Álvaro Barbosa era uma espécie de Rei Momo do futebol, técnico primeiro e único. Desentendia-se com os dirigentes trezeanos, estes dispensavam seus serviços, viravam, mexiam, mas acabavam indo buscar Barbosa, que estava sempre à disposição, como se soubesse que não podiam passar um sem o outro. Naquele tempo não havia a sofisticação de hoje (médico, treinador, assistente, massagista, roupeiro) nem os recursos permitiam esses fricotes. E Barbosa fazia de tudo, além de conhecer as quatro linhas, ensinar a chutar, driblar, defender, fazer cera e brigar pela vitória. Disciplinador emérito, duro quando necessário, era, contudo, de uma ternura insuperável, quando a situação do plantel exigia a sua dedicação de enfermeiro, massagista, (nos impedimentos do temível Corisco) e conselheiro sentimental. De poucas palavras, empolgava-se quando provocado a falar do WM, sistema de jogo que implantara no Treze e que era sua única paixão, depois do futebol propriamente dito.

E não havia outros times? Perguntarão vocês. Claro que havia. Nem todo mundo em Campina era Treze. Havia o Paulistano - fruto da tenacidade de Chico Lima, Chico Pereira, Juvenal, Heraldo do São Braz, Paulo do Pandeiro e mais meia dúzia de verdadeiros carregadores de piano; o Ipiranga, de Zé Tombador, Manoel Firmino, e outro punhado de lutadores; o Esporte, de Chico Cuentro, um trezeano dissidente de uma fibra fora do comum. Com esses times e outros que surgiam e morriam misteriosamente (lembro-me do Tabajara, camisa verde e vermelha que foi um timaço enquanto durou), Natal Belo, presidente da Liga de Desportos Campinense e grande incentivador do futebol, organizava e realizava os campeonatos da cidade. A verdade, porém, é que em termos de futebol de massa, profissional, Campina continuava a cidade de um único time e, não fora a rivalidade que sempre existiu em João Pessoa (os jogos Treze x Botafogo pelo campeonato paraibano eram verdadeiras batalhas!), o torcedor quase não tinha como exercitar o seu entusiasmo e extravasar a sua paixão.

Lembro-me que, por esse tempo, eu fazia de tudo na Rádio Borborema, inclusive, por falta de profissionais especializados, irradiava futebol. A Rádio Borborema tinha sido inaugurada em 1949, de jornal havia praticamente o semanário "O Rebate" e os cronistas, até onde me recordo, eram Marinho Leite, Nilo Tavares e, mais tarde Ramalho Filho. São desse tempo as campanhas que empreendemos em pró do surgimento de novos times e da construção de um estádio municipal em José Pinheiro.

Aqui, a memória se me embaralha e tudo o que consigo recordar é o aparecimento, como por encanto, da figura do médico Gilvan Barbosa no cenário esportivo da cidade. De repente, aquele homem bom, espiritual e simples, tomou-se de paixão pelo futebol. Empolgado com os triunfos das equipes dos filhos de sócios do Campinense Clube, dava-me a impressão de que não sossegaria enquanto não visse o seu Clube organizado como equipe de futebol, brigando com o Galo de igual para igual, disputando os campeonatos da cidade e do Estado, brilhando, empolgando a torcida, arrebatando multidões, conquistando títulos, colecionando troféus, fazendo misérias e dividindo com o Treze as honras de elevar o nome de Campina Grande no concerto do futebol nacional.

Setenta por cento de Campina viram no Dr. Gilvan o visionário. Eu - não sei porque - enxerguei o profeta.Só me lembro que lhe escancarei o coração e, com ele, os microfones da Rádio Borborema. A loucura do Dr. Gilvan espraiara-se rapidamente, contagiando Raiff Ramalho, Lamir Motta, Buarque Gusmão (ex-craque do Treze), Hilton Sabino e outros, até desaguar nesse furacão, nessa máquina de realizar o impossível e de transformar sonhos em metas, que é Edvaldo do Ó.

Em 1959, quando eu arrumava as malas e partia para o Rio de Janeiro, Campina já não era a cidade de um time só. Estava plantada a semente do que seria o Campinense de hoje.

Em 1960 entrava em campo, ainda como amador, o primeiro grande esquadrão organizado do Campinense Clube, o que vem acontecendo de lá pra cá, vocês são testemunhas e conhecem melhor do que eu. Portanto, penduro as chuteiras e me retiro de campo, para não chover no molhado...

1 Comment

  1. Anônimo on 6 de setembro de 2012 às 19:19

    Imaginem se o Campinense tivesse participado de mais campeonatos paraibanos já tinha no minimo uns 30 títulos.

     


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